Os dias da Criação relatados em Gênesis foram literais ou simbólicos?

Os dias da Criação relatados em Gênesis foram literais ou simbólicos?
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Ainda hoje, existem muitas discussões a respeito da literalidade do relato de Gênesis sobre os dias da Criação – Os 7 dias.

Seriam os 7 dias relatados períodos de 24 horas como conhecemos ou seriam dias simbólicos (alegóricos), que representariam longos períodos de tempo (talvez milhões de anos) e que assim estariam de acordo com as teorias atuais sobre a evolução e geologia da Terra?

Antes de tudo, devemos lembrar aos leitores que existem 2 períodos de criação relatados na Bíblia, o de Gênesis 1:1 que trata da criação efetiva do Universo (Céu) e tudo o que nele há, incluindo a Terra. O termo utilizado neste texto é Bereshit (do hebraico בראשית) que significa “no princípio” e só aparece duas vezes na Bíblia, a primeira em Gênesis 1:1 e a segunda no evangelho de João 1:1.

Bereshit é um “tempo indefinidoe não deve ser confundido com os “dias da criação, que possuem tempo definido, como veremos a seguir. Ou seja, a frase “No princípio criou Deus os Céus e a Terra” pode relatar um tempo muito longínquo, como bilhões de anos no passado, quanto milhões ou milhares; não há como saber, pois isto não nos foi revelado. Mas, neste ponto a Bíblia é relevante com a ciência, pois diz que houve um princípio de tudo, tanto do Universo quanto do tempo conhecido.

O outro período trata da formação da Terra para abrigar vida (criação da vida), o qual vemos em Gênesis 1:3 em diante.

Não esquecemos do Gênesis 1:2. Na verdade, ele relata o estado inicial do planeta Terra e enfatiza que ela estava “sem forma e vazia”, necessitando de um “acabamento”. E daí por diante é que Deus faria a formação do Planeta: que são as estruturas necessárias para abrigar a vida (os pilares da criação) e depois, o “enchimento” dele: que seriam os seres vivos que nele habitariam.

O próprio texto diz que quando a Terra estava sem forma e vazia, o Espírito de Deus já voava sobre ela, e mais interessante, já havia água – o que significa que quando o Planeta Terra foi criado no “princípio”, seguinte ao Universo, a água era um elemento criado neste mesmo período, dando a entender que além da Terra, a água está também presente em outras partes do Universo. Hoje a ciência comprova isso!

Também não esquecemos de Gênesis 2. Alguns críticos argumentam que o capítulo 2 de Gênesis apresenta um relato diferente da criação. Na verdade, Gênesis 2 não é um relato diferente, mas simplesmente mais detalhado. O capítulo 1 é uma visão panorâmica da criação. O capítulo 2 dá detalhes (enfatiza) sobre a criação do Jardim, do homem e das atividades do sexto dia. A história é a mesma, só o ângulo da perspectiva que é diferente.

Partindo desse princípio e já explicados alguns termos, vamos aos fatos:

O conceito de simbolismo ou alegoria do relato da criação veio de Orígenes de Alexandria, um dos pais da Igreja (185 d.C), o que ele chamava de “método alegórico de interpretação”. Orígenes é considerado o primeiro a entender os “dias” da criação no sentido alegórico, e não literal. Nesta mesma linha de pensamento, Agostinho de Hinopa (354 d.C), que é considerado o mais famoso dos pais da Igreja, seguiu Orígenes neste conceito de “método alegórico de interpretação” sobre os dias da criação, ou seja, que esses dias deveriam ser entendidos como “não literais”. Porém, Agostinho ensinava que Deus criou o mundo num só instante imediato.

Contudo, tanto Orígenes quanto Agostinho, não tinham em mente qualquer conceito evolucionista, embora ainda hoje muitos cristãos, principalmente católicos, acham que eles foram os precursores da Teoria da Evolução de Charles Darwin, a qual remete a origem dos organismos à milhões de anos atrás. Orígenes e Agostinho consideravam os “dias” da criação como não literais com base na obrigação filosófica de atribuir à Deus uma atividade criadora – sem qualquer relação com o tempo – humano.

Como os dias da criação se relacionam com Deus, argumentava-se que esses dias tinham de ser representativos de noções filosóficas associadas à Deus, tomadas nas suas respectivas perspectivas. Esse pensamento de um Deus intemporal que não poderia incorporar-se ao tempo humano, era fruto de uma influência da filosofia grega (extra bíblicos) e não de conceitos científicos como base para uma reinterpretação dos dias da criação como alegóricos. Mas, mesmo assim, esse conceito de alegoria ou simbolismo da criação permaneceu e atravessou a teologia da idade média, sendo incorporada ao modernismo e chegando até os dias com uma nova roupagem, através dos concordistas, usam outros textos bíblicos que (são realmente alegóricos) para fazer com que as longas eras explicitadas pelo naturalismo e teoria evolucionista concorde com as implicações cronológicas do relato bíblico da criação.

Será que os críticos textuais especialistas acreditam que o texto bíblico do período da criação é literal ou simbólico?

Se, por exemplo, a palavra “dia” nestes capítulos não significa um período de 24 horas, então a interpretação das Escrituras é impossível. (Marcus Dods (1834–1909), Teólogo escocês, Professor de Exegese do Novo Testamento e Reitor do “New College” (Edimburgo) – The Book of Genesis, Armstrong, NY, p. 4, 1907)

O Dr. James Barr (Regius Professor de Hebreu na Universidade de Oxford), que mesmo não acreditando na historicidade de Gênesis, no entanto, disse isto a respeito da linguagem de Gênesis 1:

Que eu conheça, não há nenhum Professor de Hebraico ou de Velho Testamento em nenhuma universidade de nível mundial que não acredite que o(s) escritor(es) de Gn 1-11 intentaram passar para seus leitores ideias de que (a) a criação ocorreu numa série de seis dias que eram os mesmos dias de 24 horas que nós temos hoje (b) que as figuras contidas nas genealogias de Gênesis proviam por simples adição uma cronologia do começo do mundo até as épocas mais recentes da história bíblica (c) e que o Dilúvio de Noé era entendido como global e extinguiu toda vida humana e animal exceto aqueles na Arca. (James Barr, Carta à David C.C. Watson, 23 de Abril, 1984.)

Nos dias de Martinho Lutero, alguns também tinham dúvidas acerca dos dias de Gênesis, só que ao contrário dos dias de hoje, eles acreditavam que Deus tinha criado o mundo em um só dia, conforme vimos acima, crença de Agostinho. A respeito disso, Lutero escreveu:

Quando Moisés escreveu que Deus criou os Céus e a Terra e tudo o que neles há em seis dias, então deixe que este período continue sendo seis dias. E não se aventure a escrever qualquer comentário dizendo que esses seis dias eram um dia. Mas se você não pode entender como que isto poderia ter acontecido em seis dias, então dê ao Espírito Santo a honra de ser mais inteligente que você. Pois você deve lidar com as Escrituras de tal maneira que você tenha em mente que Deus quis dizer aquilo que escreveu. E, como é Deus que está falando, não é lícito que você dobre Sua Palavra na direção que você quiser. (Martinho Lutero, citado em E. M. Plass, What Martin Luther Says, a Practical In-Home Anthology for the Active Christian (St. Louis, Missouri: Concordia Publishing House, 1991), 1523.)

O termo yôm e seu significado

Quando Moisés, segundo a inspiração de Deus, compilou a descrição da criação em Gênesis 1, ele usou a palavra hebraica ‘yôm‘ (do hebraico יום)  para ‘dia’. Ele combinou yôm com números (‘primeiro dia’, ‘segundo dia’, ‘terceiro dia’, etc.) e com as palavras “tarde e manhã”. Para além disso, a primeira vez que ele usou a palavra yôm, ele definiu-a como sendo o ciclo “noite/dia” (Gênesis 1:5).

No hebraico original do Antigo Testamento, a palavra dia (yôm) ocorre 2.300 vezes, com 1.450 ocorrências no singular e 850 no plural. Seu alcance semântico é restrito a apenas 5 significados:

(1) Período de luz no ciclo de um dia/noite;

(2) Período de 24 horas;

(3) Conceito vago ou geral de tempo;

(4) Um ponto específico no tempo;

(5) Período de um ano.

Quando yôm é modificado por um número cardinal, ele quer dizer um dia de 24 horas. Fora de Gênesis 1, yôm é usado com um número cardinal 359 vezes, e em todas elas o significado é de um dia literal. Por que em Gênesis 1 seria diferente?

Ainda fora de Gênesis 1, yôm é usado com as palavras tarde e manhã 23 vezes, manhã e tarde aparecem sozinhas sem yôm outras 38 vezes. Todas estas 61 vezes o texto se refere a dias ordinários. Por que que Gênesis 1 seria a exceção?

A partir daí, por toda a Bíblia, sempre que yôm foi usada desta forma, ela significou sempre um dia  (ou dias) normal (is) com 24 horas. O sentido normal de yôm é certamente um período de 24 horas.

Há, portanto, um caso prima facie de que, sempre que Deus usou a palavra yôm desta forma, Ele tencionou sempre passar a mensagem de que os dias da criação haviam sido dias normais.

Consideremos agora outras palavras que Deus poderia ter usado se Ele quisesse transmitir a noção de que os dias da criação haviam sido longos períodos de tempo e não dias com 24 horas de duração:

Há várias palavras hebraicas que se referem a breves ou longos períodos de tempo. Entre estas encontram-se as palavras:

  • qedem: que é a principal palavra-única para “antigo”, e às vezes é traduzida como “da antiguidade”;
  • olam: significa ‘permanente’ ou ‘eternidade’ e a mesma é traduzida como “perpétuo”, “dos tempos antigos” ou “para sempre”;
  • dor: significa ‘uma revolução do tempo’ ou ‘uma era’ e é às vezes traduzida como “gerações”
  • tamid: significa ‘continuamente’ ou ‘para sempre’
  • ad: significa ‘tempo ilimitado’ ou ‘para sempre’
  • orek: usada com yôm é traduzida como “duração de dias”
  • shanah: significa ‘um ano’ ou ‘a revolução do tempo’ (da mudança de estações)
  • netsach: significa ‘para sempre’.

Palavras para um período de tempo mais curto são, por exemplo, eth (um termo geral para tempo); e moed, significando “estações” ou “festivais”.

Vamos agora considerar como algumas destas palavras poderiam ser usadas, em:

1. Eventos antigos

Se Deus nos quisesse dizer que os eventos da criação ocorreram há muito tempo no passado, haveria formas de o fazer:

  • yamim: (plural de yôm), usada sozinha ou com “tarde e manhã” significaria que “foram dias de tardes e manhãs.” Esta seria a forma mais simples que mais facilmente poderia significar muitos dias e portanto a possibilidade de vastas eras;
  • qedem: sozinha ou com “dias”, significaria “e foi desde os dias da antiguidade“;
  • olam: com “dias” significaria também “e foi desde os dias da antiguidade“.

Portanto, se Deus nos quisesse comunicar uma criação antiga, havia pelo menos três formas através das quais Ele poderia tê-lo feito. No entanto, Deus não usou nenhuma delas.

2. Um evento contínuo desde a antiguidade

Se Deus nos quisesse dizer que a criação começou no passado, mas que continuava no futuro (significando algo parecido com a “evolução teísta”) havia várias formas de fazê-lo:

  • dor: usado singularmente ou com a palavra “dias”, “dias” e “noites”, ou “tardes e manhãs”, poderia significar “e foram gerações de dias e noites“. Esta seria a melhor palavra para indicar os períodos longos necessários para a evolução, se isto fosse o que Deus tinha em Mente;
  • olam: com a preposição le, adicionado às palavras ‘dias’ ou ‘tarde e manhã’ poderia significar “perpétuo”; outra construção le olam va-ed significa ‘a partir da era em frente’ e é traduzida como ‘para todo o sempre’ em Êxodo 15:18;
  • tamid: unida à palavra ‘dias’, ‘dias’ e ‘noites’, ou ‘tarde’ e ‘manhã’, poderia significar “e foi a continuação de dias“;
  • ad: usada sozinha ou com olam poderia significar “e assim foi para sempre“;
  • shanah: (ano) poderia ter sido usada figurativamente para “longo tempo”, especialmente no plural.
  • yôm rab: significa literalmente “um dia longo”. Esta construção poderia ter sido usada por Deus se Ele quisesse que nós entendêssemos que os “dias” eram longos períodos de tempo.

Portanto, se Deus quisesse que nós acreditássemos num longo período de processos criativos, existem várias expressões que Ele poderia ter usado. No entanto, Deus não usou nenhuma delas.

3. Tempo incerto

Se Deus quisesse que nós soubéssemos que a criação ocorreu no passado, embora não fornecendo qualquer tipo de indicação real em torno da duração do processo, havia formas de o fazer:

  • yôm: combinada com “luz” e “escuridão”, poderia significar “e foi um dia de luz e escuridão”. Isto poderia ser incerto devido ao uso simbólico de “luz” e “escuridão” no resto da Bíblia Hebraica. No entanto, yôm usada com “tarde e manhã”, especialmente com um número associado, nunca é incerto;
  • eth: (‘tempo’) combinada com “dia” e “noite” como em Jeremias 33:20 e Zacarias 14:7 poderia ser ambígua. O mesmo se tivéssemos eth combinada com “luz” e “escuridão” (construção teorética).

Se alguma dessas formas tivesse sido usada, a duração dos “dias” da criação seriam uma questão aberta ao debate. No entanto, e sem surpresa alguma, Deus escolheu não usar nenhuma destas expressões.

A intenção do autor

As considerações seguintes mostram-nos o que Deus pretendia que nós entendêssemos. O significado de qualquer parte da Bíblia tem que ser decidido segundo as intenções do Autor.

No caso de Gênesis, a intenção do autor era claramente a de escrever uma descrição histórica. Isto é feito manifesto pela forma como o Senhor Jesus e o Apóstolo Paulo consideravam Gênesis, ou seja, que o mesmo é verdadeiro e não algo simbólico, alegórico ou mítico.

É declaradamente óbvio que não foi intenção do autor transmitir alegorias, poesia, fantasias ou mito. Portanto, o que Deus, através de Moisés, disse sobre a criação em Gênesis não pode ser interpretada de uma forma que contraria as intenções do autor.

Moisés usou, de fato, algumas das palavras em referência a “longos períodos de tempo”, mas nunca em referência aos dias da criação. Por exemplo:

Gênesis 1:14:

E disse Deus: Haja luminares na expansão dos céus, para haver separação entre o dia e a noite; e sejam eles para sinais e para tempos determinados [moed] e para dias e anos;

Gênesis 6:3:

Então disse o Senhor: Não contenderá o meu Espírito para sempre [olam] com o homem;

Gênesis 9:12:

E disse Deus: Este é o sinal do concerto que ponho entre mim e vós, e entre toda a alma vivente, que está convosco, por gerações eternas [olam dor].

Números 24:20:

E, vendo os amalequitas, alçou a sua parábola, e disse: Amalec é o primeiro das gentes; porém o seu fim será para perdição [ad]

Deuteronômio 30:20:

Amando ao Senhor, teu Deus, dando ouvidos à sua voz e te achegando a ele: pois ele é a tua vida e a longura dos teus dias [yôm orek]

Deuteronômio 32:7,

Lembra-te dos dias da antiguidade [yôm olam];

….e assim sucessivamente.

Por que é que Deus não usou nenhuma dessas palavras em referência aos dias da criação, sendo que Ele as usou para descrever outras coisas?

Claramente, era Sua intenção que nós entendêssemos que os dias da criação foram dias normais, e não longos períodos de tempo, como imaginam alguns.

A Bíblia é a mensagem de Deus para o homem e como tal, ela faz declarações autoritárias em relação à realidade. Se alguém remove alguma parcela da Bíblia do domínio da realidade, Deus pode mesmo assim Se comunicar conosco, mas o leitor nunca pode ter a certeza se ele entende as intenções do autor.

Além disso, se a comunicação de Deus para nós está fora do domínio da realidade, então nós não podemos saber se alguma parte da Bíblia significa o que as palavras dizem ou se significam algo totalmente diferente.

Quando tais jogos de palavras são feitos com a Bíblia (exatamente o que os contrários a ela e as potestades demoníacas querem que aconteça), não só a Bíblia perde a sua Autoridade, como nós perdemos a perspectiva Divina da realidade, e o Cristianismo perde o seu poder transformador.

Se os “dias” de Gênesis não eram dias normais, então Deus pode ser Acusado de ter enganado o Seu Povo durante milhares de anos. Os comentadores Judeus e Cristãos universalmente consideraram os dias de Gênesis como dias normais até a altura em que a “Igreja” começou a tentar harmonizar a Bíblia com os “milhões de anos” e as fábulas de Darwin.

Conclusão

A) Em Gênesis 1, Deus, através de Moisés, desdobra-Se para mostrar que os dias da criação foram dias normais – 24 horas cada. Para atingir este fim, Ele usou a palavra hebraica yôm, combinada com um número e com as palavras “tarde e manhã”.

B) Se Deus quisesse que nós soubéssemos que era uma criação antiga, Ele poderia tê-lo feito usando as variadas formas de identificar longos períodos de tempo.

C) Se Ele tivesse em Mente a “evolução teísta”, havia várias construções que Ele poderia ter usado no Texto Sagrado. Se tivesse como propósito mostrar que o fator tempo era incerto, então a linguagem hebraica continha formas de o fazer.

D) Deus não usou formas literárias que passassem a mensagem de algo diferente dos dias normais.

E) O único significado que é possível extrair a partir do Hebraico é o dos dias da criação serem dias de 24 horas. Deus não poderia ter comunicado este ponto de forma mais clara do que a forma presente em Gênesis 1.

 

Referências:

Darwinismo – Os dias de Génesis;

Revista Criacionista – Dias literais ou períodos de tempo figurados?;

Creation – How long were the days of Genesis 1?

Imagem fonte: Understand Christianity

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